Por Luciano Zanella e Wolney Castilho
Março, 2019 – Um recurso tão presente na vida cotidiana que, muitas vezes, só notamos sua importância quando falta: é assim que muitos de nós tratamos a água potável.
O tema selecionado pela ONU para reflexão no próximo 22 de março, Dia Internacional da Água – Water for all: living no one behind (‘Água para todos: não deixando ninguém para trás’, em tradução livre) – nos lembra algo interessante: o ato quase mágico da água surgindo de uma torneira, ao qual estamos acostumados, não é uma realidade para considerável parte da população mundial.
Se a falta de água potável parece um fato muito distante, basta relembrar o ocorrido em diversas regiões do estado de São Paulo num passado recente, em 2014 e 2015, quando um período prolongado de estiagem levou o abastecimento de muitas cidades a níveis críticos de escassez. Nessa época, para muitos de nós, o simples ato de lavar roupas ou tomar um banho tornou-se um desafio diário.
Situação muito comum em outras áreas do país. Dados do Plano Nacional do Saneamento de 2013 mostram que no Brasil, em 2010, apenas 60% da população contava com abastecimento adequado. Do restante, 64 milhões (33,9%) de brasileiros contavam com abastecimento precário e cerca de 13 milhões (6,8%) de pessoas, sequer com isso.
O caso mais emblemático em território nacional é o do semiárido, que enfrenta períodos de estiagem frequentes e problemas referentes à qualidade das águas nas fontes, muitas delas inadequadas ao consumo humano. Mas há outras regiões em que o acesso à água potável também não é fácil: muitas das comunidades ribeirinhas da região amazônica, povoados construídos praticamente sobre os grandes rios e igarapés, não tem acesso a ela. Nesse caso, o fator limitante não é a falta do recurso, mas a qualidade da água disponível, muitas vezes imprópria para consumo devido a contaminantes.
E não é só em regiões distantes que isso acontece. Nas zonas rurais de muitos municípios ou até em alguns nichos específicas dentro de áreas urbanas, inclusive na região Sudeste, por uma série de motivos diferentes, muitas vezes o acesso à água é precário, limitado ou inexistente.
Uma vez que não existe solução que possa ser aplicada de modo amplo e indiscriminado, é preciso analisar cada situação. Soluções simples, implementadas com os cuidados técnicos necessários, muitas vezes podem ser as mais adequadas. O aproveitamento de águas de chuva, como forma de permitir o abastecimento mais seguro em locais onde o acesso à água potável é problemático, é um exemplo. Intensamente adotado na região semiárida brasileira, também foi uma das soluções complementares de abastecimento mais utilizadas durante o período de escassez hídrica pela qual a região Sudeste passou entre 2013 e 2015.
Por outro lado, soluções mais complexas exigem o manejo integrado de águas urbanas, abordando todo o seu ciclo e estabelecendo alternativas para que as águas sejam utilizadas de forma eficiente. Desenvolvimento, avaliação e uso de equipamentos sanitários economizadores, estruturação de programas de uso eficiente de água e acompanhamento de consumo, uso de fontes alternativas como forma de abastecimento complementar e até mesmo o manejo das águas de drenagem urbana, além do correto tratamento dos esgotos gerados para evitar a contaminação de mananciais, podem fazer parte de programas mais complexos para locais onde existe o abastecimento de água potável, mas a disponibilidade hídrica torna-se crítica para guarnecer a população existente. É o caso de um bom número de regiões metropolitanas brasileiras.
Não deixar ninguém para trás significa garantir a disponibilidade e o manejo sustentável da água para todos, como estabelece o Objetivo 6 do Desenvolvimento Sustentável da agenda 2030 da ONU, da qual o Brasil é um dos países signatários. Significa olhar para esses locais e buscar alternativas efetivas para garantir o acesso à água, sempre empregando tecnologias adequadas.
Luciano Zanella e Wolney Castilho, são Pesquisadores do Laboratório de Instalações Prediais e Saneamento do IPT.
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