Roberto Sampaio, partner e conselheiro da Empírica
Novembro, 2021 – Com a pandemia de Covid-19, o mercado imobiliário apresentou um boom. A baixa taxa de juros e o isolamento fez muitos considerarem a compra de um novo lugar para viver, seja por questões de conforto ou de mudança de vida, como a ida para casas maiores ou para o interior. Para se ter uma ideia, de acordo com a Abecip (Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança) o volume de financiamentos imobiliários cresceu 57,5% no ano passado. Além disso, este ano vem apresentando um recorde de lançamentos imobiliários. O Indicador Abrainc-Fipe aponta que no primeiro trimestre de 2021 foram lançadas 26.384 unidades de imóveis no Brasil, o que representa um crescimento de 39% em relação ao mesmo período de 2020.
Mas, com o aumento da taxa Selic pelo Copom, o cenário deve mudar um pouco. A expectativa é de um mercado ainda exuberante este ano e em 2022, com bom desempenho em 2023, mas sem altas expressivas. A taxa de juros é um fator determinante para o desenvolvimento do mercado imobiliário. Com uma taxa mais alta, a possibilidade de compra diminui, desencorajando muitas pessoas que pensavam em adquirir um imóvel. Este reflexo não está apenas em imóveis residenciais, a construção de imóveis comerciais e galpões logísticos também diminui. O aumento da taxa de juros afeta a indústria como um todo.
Estamos com uma taxa Selic de 7,75%, com previsão de que ela chegue a 9,25% no final deste ano. É uma taxa que provoca uma diminuição do mercado, embora muito longe dos patamares da década de 90 com taxas que em alguns momentos chegaram a ultrapassar 40% ao ano, o que foi um verdadeiro pesadelo para o mercado imobiliário. Ainda assim, nossas taxas são consideravelmente altas.
A taxa atual dos Estados Unidos, definida pelo FED (Banco Central Americano), é de 0% a 0,25%. Isso explica o fantástico desempenho da indústria imobiliária americana e a enorme diferença com a nossa, mesmo proporcionalmente aos PIBs dos dois países. Uma taxa de juros alta impede o acesso de uma parcela grande da população. Com uma taxa de juros nos patamares da norte-americana, essa dificuldade não existiria. O último relatório do déficit habitacional brasileiro, produzido pelo Ministério do Desenvolvimento Regional, mostra que metade do déficit é devido às pessoas não terem acesso ao crédito. Isso significa que cerca de 3 milhões de pessoas teriam uma casa própria digna para morar se não fosse a alta taxa de juros.
Embora ao passar pelas ruas, principalmente nos bairros centrais das grandes cidades, tenhamos a impressão de que o país está cheio de obras, esta não é a realidade. As construções estão bastante localizadas em certas regiões, em detrimento de outras. A necessidade imobiliária brasileira é muito maior do que o volume de projetos em andamento. Um bom exemplo disso é a enorme quantidade de moradores de rua, que pode ser notada em um curto passeio pelas capitais brasileiras e a quantidade de favelas nas nossas cidades. Para atender à carência nacional, seria necessário um modelo parecido com o chinês, em que uma cidade é construída a cada mês. Os números do mercado imobiliário em todos os setores mostram o quanto temos que crescer: a quantidade de shoppings, imóveis logísticos, edifícios de escritórios corporativos de qualidade é ínfima se comparado com os principais países do mundo. Estamos muito atrás se comparados a essas potências. E muito desse atraso se deve às taxas de juros.
A expectativa é que com a definição do cenário político, a economia esteja em um rumo mais seguro. A alta da inflação e do dólar se deve em grande parte à questão política. Com ela se amenizando, a taxa de juros deve baixar, ficando em um patamar abaixo dos dois dígitos, em torno de 6 ou 7%. Com isso, o mercado imobiliário pode caminhar, mas sem um grande boom. Isso está longe da necessidade brasileira. Precisamos de taxas mais baixas para estimular a economia e desenvolver muito a indústria imobiliária. Estamos muito abaixo do necessário em financiamento imobiliário e lançamentos para diminuir o déficit habitacional. É preciso aumentar também a produção de imóveis comerciais, centros de compras, hotéis e imóveis logísticos. Mudanças são necessárias e para já.
Roberto Sampaio é Sócio e Conselheiro da Empírica, gestora especializada em crédito estruturado. Engenheiro civil formado pela Escola Politécnica da USP (Poli-USP) e mestre em Habitação pelo Instituto de Pesquisa Tecnológicas de São Paulo (IPT-SP). Atua há mais de 30 anos no setor imobiliário, tendo sido diretor de Real Estate no Unibanco, BankBoston, Citibank e HSBC. Atuou como membro e vice-presidente da Abecip – Associação Brasileira de Crédito Imobiliário e Poupança, membro e diretor-executivo da Abel – Associação Brasileira das Empresas de Leasing e membro da Comissão de Finame-BNDES da Febraban. Compõe o Comitê de Mercado de Real Estate da Poli-USP, onde leciona no curso de especialização em Real Estate e nos cursos de especialização em Gerenciamento da Construção Civil da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo do Mackenzie. É membro do Conselho de Administração da Empírica