Fevereiro, 2022 – Inegavelmente encantadora, a cidade de Paraty, ao comemorar 355 anos, neste dia 28 de fevereiro, mostra a razão para tanto turismo e atenção pela rica arquitetura preservada em sua origem. O Centro histórico, localizado no litoral sul do estado do Rio de Janeiro, não apenas mostra suas construções coloniais, como também se transformou em inspiração para diversos outros projetos.
O século é 18, o patrimônio ficou no caminho entre as pedras e o ouro de Minas Gerais e Portugal. Suas construções são singelas, marcadas pelos elementos pau-a-pique, taipa, adobe, paredes caiadas e portas e janelas em cores que nos remetem ao período colonial, que se preservam até os dias de hoje.
Nos primeiros séculos de colonização portuguesa, Paraty foi a porta de entrada para os caminhos que interligavam as cidades mineiras que extraiam os ricos metais preciosos e os diamantes que abasteciam a Europa. Posto que foi transferido à capital, especialmente após a transferência da coroa portuguesa que se refugiou na cidade do Rio de Janeiro ante os ataques de Napoleão Bonaparte na Península Ibérica.
E para comemorar este dia, Marcello de Oliveira – diretor de arte da KPMO Cultura e Arte, arquiteto, urbanista e curador, revela algumas curiosidades sobre o Centro Histórico de Paraty.
– A cidade foi desenvolvida, com ruas assimétricas e fortes para evitar ataques de invasores e saqueadores, uma vez que por ser a rota do ouro atraia muitos ladrões dos mares.
– Dizem que as pedras calçadas por escravos que cobrem Paraty inteira têm o nome “pé de moleque” por conta de doceiras que deixavam as iguarias em suas portas e quando eram furtadas por meninos travessos gritavam “pede, moleque”, e assim ficou. Mas da visão de urbanismo, o calçamento das pedras era mais alto por causa da canalização da água do mar e da chuva.
– Existe uma geometria na urbanização para que as ruas projetadas em formato de canal pudessem suportar as cheias e o escoamento das águas com os movimentos das marés. Esta solução é eficiente e funciona até os dias atuais, observe que ao final da tarde a maioria das ruas próximas ao mar são invadidas pelas cheias das águas e das marés. Essa estrutura urbana tinha uma funcionalidade importante: as residências não possuíam banheiro e para escoar os dejetos que eram dispensados nas ruas o pavimento foi construído abaixo do nível da maré alta, o que facilitava a lavagem natural e assepsia com a água do mar. Essa era uma técnica bastante utilizada nas ocupações do Império Romano por toda a Europa.
– O patrimônio histórico preservado até hoje caracteriza uma arquitetura em alvenaria ocupando toda a extensão das ruas e esquinas, edificações com um ou dois pavimentos, com aberturas em portas e janelas em estilo colonial. Um aspecto curioso e que vale ser destacado, identifica as casas pela classe social de seus ocupantes: as famílias mais abastadas construíam suas casas com beirais em cimalha, que são aplicações na parte superior do entablamento, abaixo do telhado; os menos abastados construíam suas casas em formato de “cachorro”, beirais mais simples sem ornamentação.
– A cidade tem grande influência maçônica e isso pode ser visto nos desenhos geométricos em relevo nas fachadas de sobrados, formas de triângulos em muitos lugares e também em suas tonalidades de azul.
– A inspiração na arquitetura colonial portuguesa é evidente, porém os vidros ficaram apenas para o lado de fora, uma vez que quando chegaram ao Brasil, as casas já estavam construídas.
Destaque: Estrada Real e o Caminho Velho (Paraty – Ouro Preto)
Paraty foi o ponto de partida para as grandes explorações em direção ao interior das minas, por onde circulavam o ouro extraído da região e as mercadorias que abasteciam esse caminho. Essa rota comercial deu origem ao que hoje conhecemos como “Estrada Real” e muitas delas tiveram origem a partir de antigas trilhas indígenas.
A movimentação através do Caminho Velho crescia à medida que a região mineradora prosperava e Paraty teve grande destaque pelo importante papel como posto de controle e fiscalização do escoamento do ouro que era enviado para Portugal. As tropas que traziam os metais explorados nas minas retornavam carregando todo o tipo de utensílios, bens manufaturados, quinquilharias, produtos domésticos, agricultura, oficinas e suprimentos para a variada comercialização nas vendas e armazéns localizados ao longo dos caminhos.
A cidade cresceu e transformou-se numa das sedes administrativas da coroa portuguesa de grande destaque e como consequência importantes monumentos, edifícios religiosos e residências abastadas foram construídas e até hoje temos esse importante conjunto arquitetônico preservado para as futuras gerações.
Marcello de Oliveira – O traço, o desenho e as cores sempre sobressaíram entre os interesses de Marcello e tornaram-se decisivos em sua formação como arquiteto pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo FAU/USP (1994). Desenvolveu ao longo dos anos experimentações acadêmicas, no Brasil e no exterior. Dedicou-se ao estudo da história da arte, das artes plásticas e da fotografia, o que o levou a realizar diversas viagens temáticas com foco em arquitetura, design e arte universal. Esse multipluralismo definiu sua identificação com a área de criação de arte de livros, exposições e eventos.