As vendas de cimento em dezembro somaram 4,5 milhões de toneladas, uma queda de 6,3% em relação ao mesmo mês de 2021, de acordo com o Sindicato Nacional da Indústria de Cimento (SNIC). Com esse resultado, o setor termina o ano de 2022, com um total de 63,1 milhões de toneladas de cimento vendidas, uma retração de 2,8% sobre o ano anterior, ou seja, 1,8 milhão de toneladas a menos.
Esse resultado negativo ocorre após o bom desempenho do triênio 2019-2021, que mesmo com a pandemia da Covid-19, registrou crescimentos de 3,8% em 2019, 10,8% em 2020 e 6,8% em 2021, e havia recuperado 12 milhões de toneladas das 19 milhões perdidas no período 2015-2018. Entretanto, o recuo de 2022 faz com o que as vendas do cimento fiquem 8,8 milhões toneladas abaixo do recorde de 71,8 milhões em 2014.
A taxa de inflação começou o ano passado com significativos dois dígitos, permanecendo assim durante diversos meses, levando o Banco Central a aumentar a Selic de 9,25% para 13,75%. Essa política, além de encarecer o financiamento imobiliário, incentiva uma migração para investimentos em produtos financeiros.
Nesse sentido o setor imobiliário, um dos principais indutores do consumo de cimento, apresentou queda significativa no número de lançamentos contribuindo assim negativamente para o ano 2022. Dados até setembro apontam uma redução de 8,5% nos lançamentos¹ e um ligeiro crescimento de 0,1% nas vendas de imóveis. Esse, movimento reduz o estoque de obras e consequentemente a demanda por cimento.
O desempenho da política habitacional popular (Casa Verde Amarela) foi decepcionante com queda de 26,2% e 9,3% nos lançamentos e nas vendas até setembro, respectivamente. O número de unidades financiadas para construção através do SBPE (Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo) também caiu, 5,8% até novembro.
Apesar da recuperação do mercado de trabalho e a redução do desemprego, o rendimento da população não se comportou da mesma forma, os salários estão menores do que antes da pandemia. Essa combinação de inflação alta e salários baixos reduziu o poder de compra da população e o resultado pode ser visto no alto endividamento das famílias, que atingiu patamar recorde de 50%. Com o poder de compra menor, as pessoas direcionam seus gastos para itens básicos como alimentação e vestuário, postergando investimentos em obras e reformas, reduzindo drasticamente um dos vetores de vendas do insumo que se deu entre 2019 e 2020 que foi a autoconstrução.
Em linha com as projeções apontadas pelo SNIC, as chuvas, com registros acima da média em 2022, também impactaram a comercialização do cimento e atrapalharam os cronogramas das obras. Além disso, a Copa do Mundo sozinha comprometeu 0,5 ponto percentual das vendas do produto, ou seja, cerca de 300 mil toneladas.
As regiões Norte e Centro-Oeste foram as únicas a apresentarem variações positivas em 2022, impulsionadas, principalmente, pela expansão imobiliária e autoconstrução, diferentemente das demais que amargaram quedas consideráveis.
O aumento sistêmico dos custos de produção, acelerado durante a pandemia, persistiu em 2022, impactado pela guerra entre Rússia e Ucrânia. O desarranjo logístico global do transporte marítimo, os seguros, os combustíveis das embarcações e consequentemente o frete encareceram significativamente. O coque, principal combustível da indústria do cimento foi majorado em 92% no acumulado em 2021 e 2022.
Para minimizar esse impacto a indústria investe fortemente na utilização de combustíveis alternativos. A atividade conhecida como coprocessamento é uma das principais ferramentas para a descarbonização do setor, que já alcança 28% de participação da matriz energética, antecipando a meta prevista no Roadmap para 2025. A recuperação destes resíduos faz parte da economia circular, contribuindo diretamente para a erradicação de lixões, geração de renda e redução de gases do efeito estufa, especialmente metano e CO2.
A atividade segue avançando como referência mundial na redução de sua pegada de carbono e na produção de “cimentos verdes”. A Associação Global de Cimento e Concreto (GCCA, em inglês) se antecipou ao lançar, em 2021, o Roadmap Net Zero para acelerar a transição rumo a uma economia neutra em carbono. Foi o primeiro setor a firmar um compromisso de neutralidade climática, em escala mundial, dentro do programa “Race to Zero” da ONU.
Como desdobramento desse programa, o Brasil foi escolhido pela GCCA, junto a outros quatro países, para atualizar o seu Roadmap de Mitigação (2019) para um Roadmap de Neutralidade da Indústria do cimento nacional – vale destacar que este mapa de mitigação é, até hoje, o maior compromisso de descarbonização de um setor industrial brasileiro. O novo projeto foi iniciado pela indústria do cimento brasileira no segundo semestre de 2022, com conclusão prevista para o final de 2023.
“Enfrentamos um ano com muitas adversidades. Já estimávamos um recuo de até 2% considerando os impactos das eleições e a Copa do Mundo. As fortes chuvas, o crescimento da inflação, as altas taxas de juros, o elevado endividamento das famílias e o conflito entre Rússia e Ucrânia fizeram com que a indústria do cimento registrasse uma queda que se manteve durante todo o ano. Após fecharmos um 2021 com um crescimento de 6,6%, o setor termina 2022 com um total de 63,1 milhões de toneladas de cimento vendidas, uma queda de 2,8% sobre o ano anterior.”
Paulo Camillo Penna – Presidente do SNIC